Saúde

Simpósio de Pesquisa em Ciências da Saúde debate pesquisas em torno dos canabinoides e seus princípios terapêuticos

As atividades do 15º Simpósio de Pesquisa em Ciências da Saúde da Unesc encerraram no fim da tarde da última sexta-feira (31/5) e trouxeram para o debate o papel do sistema endocanabinoide no tratamento do estresse pós-traumático, o impacto dos canabinoides (compostos encontrados na cannabis) no cérebro adolescente, seus diferentes usos e a maconha como fator de risco para doenças neuropsiquiátricas. Os assuntos foram abordados por pesquisadores de diferentes instituições de ensino, que também dialogaram com a plateia, formada por estudantes de graduação, mestrado e doutorado, professores e pesquisadores em Ciências da Saúde.

A coordenadora do Simpósio, Gislaine Zilli Réus, faz uma avaliação positiva do evento. Segundo ela, por ainda não haver pesquisa na Universidade sobre o assunto, trazer a temática para o debate agregou novos conhecimentos à comunidade acadêmica. “Vamos sair daqui refletindo sobre o tema. O uso da cannabis recreativo, o uso ilegal, sabemos que vai causar dano e aumentar o risco para muitas doenças. Mas o uso de um composto da planta chamado canabidiol em casos de doenças específicas, que foi muito falado no evento, vem apresentando bons efeitos. No entanto, há que se ter cuidado. Como foi enfatizado no Simpósio, ainda há muito a ser pesquisado e analisado”, afirma Gislaine.

O evento é uma parceria do PPGCS (Programa de Pós-Graduação em Ciências da

Saúde) e do Laboratório de Psiquiatria Translacional da Unesc. A programação contou com palestras na noite de quinta-feira (30/5) e na manhã e tarde da sexta-feira (31/5), além de apresentação de trabalhos. Entre os 93 trabalhos inscritos a comissão avaliadora do Simpósio escolheu as quatro melhores pesquisas e os três melhores pôsteres apresentados.

Programação intensa

 Dentro do tema central “Maconha, Canabinoides e Terapêutica” o Simpósio de Pesquisa teve uma programação intensa, e abordou assuntos como números da dependência do uso de maconha, as políticas públicas envolvendo o assunto e do uso de substâncias retiradas da planta cannabis em tratamentos de saúde.

Os trabalhos do último período do evento foram iniciados pelo professor doutor e coordenador do Laboratório de Neurociência Comportamental da Unisul, Rafael

Mariano De Bitencourt, que ministrou a palestra “Aprendendo a esquecer: O papel do sistema endocanabinoide na extinção de memórias aversivas”. Ele explica que o Transtorno de Estresse Pós-Traumático tem relação direta com o fato de a pessoa rememorar o trauma e a aversão e o sistema endocanabinoide é essencial para a extinção dessa memória aversiva.

“O canabidiol (uma das substâncias químicas canabinoides encontradas na planta cannabis sativa) é uma substância segura e com possibilidades terapêuticas interessantes. Ele facilitou a extinção de memórias aversivas em ratos. E nós que trabalhamos com animais ficamos pensando no que a substância vai fazer nas pessoas. Um outro grupo realizou a pesquisa em humanos e administrou o canabidiol ou canabidiol e THC (tetra-hidrocarbinol) e o resultado foi que as substâncias colaboram sim no tratamento do transtorno de estresse pós-traumático”.

Impacto do uso da maconha no cérebro dos adolescentes

Na segunda palestra da tarde, o médico e professor doutor Thiago Gatti Pianca, do Rio Grande do Sul, falou sobre “O impacto dos canabionoides no cérebro adolescente”. Segundo ele, ainda não há muitas pesquisas sobre os efeitos da maconha no cérebro de pessoas jovens, mas o que já se sabe que a dependência é causada pelo uso com foco no efeito psicoativo e não terapêutico.

“Temos mais perguntas que respostas nesse momento sobre o cérebro do adolescente e o efeito do canabinoide. Mas estudos apontam uma diminuição de QI com o uso de maconha. No estudo, percebeu-se que quem começou a usar na adolescência, teve uma redução de QI maior do que quem iniciou na fase adulta. É cedo para se ter um consenso, mas essa pesquisa é muito importante. Ela apontou uma diferença de até 8 pontos do QI entre quem usa maconha e quem não faz uso”, comenta.  

Os múltiplos usos dos canabinoides

O neurologista pediátrico Jaime Lin, falou sobre os “Aspectos Clínicos: Os múltiplos usos dos canabinoides”, e apresentou resultados de pesquisas recentes sobre a eficácia do uso dos canabinoides em pacientes com problemas de saúde como Doença de Parkison, Transtorno do Espectro Autista ou que tem epilepsia.

Segundo o médico, uma pesquisa perguntou para o público e para médicos generalistas e para neurologistas se apoiariam o uso medicinal dos derivados da maconha. Cem por cento dos pacientes apoiariam o uso e metade dos neurologistas e cerca de 83% dos médicos generalistas apoiariam. Em seguida, a revista responsável pela pesquisa entregou o encarte especial sobre segurança e eficácia dos canabinoides e perguntaram se eles deveriam ser prescritos sem nenhum tipo de controle. O resultado é que zero por cento dos médicos acreditam que possa ser oferecida medicação desse jeito, mas 35% do público acha que pode ser. Cerca de 30% dos profissionais de Medicina acredita que de maneira controlada, possa ser prescrito. Já mais de 70% do público concordou. “Mesmo com todas as evidências, o público em geral vai acreditar no que ele quiser. Cabe a nós, profissionais de saúde, nos atualizar e pesquisar cada vez mais sobre o assunto”.

Doenças mentais

 O médico e professor doutor Sergio De Paula Ramos, abordou o tema “Maconha como fator de risco para doenças neuropsiquiátricas”, e afirma que a maconha é uma droga particularmente usada por jovens e por isso quando fala sobre o impacto dela no sistema nervoso, é preciso estudar a atuação em um cérebro juvenil. “Legalizar a maconha aumenta a demanda por serviços médicos. E se baixarmos a percepção de risco, aumentamos o consumo. E tudo é agravado pelo consumo de dela: quadros de psicose, depressão e intenção suicida”. 

Ramos apresentou dados de pesquisas feitas em jovens, que apontam que o uso semanal da planta aumenta em mais de 30% os casos de quadros psicóticos e que quanto mais frequente o uso e mais concentrada a maconha for, maior a chance de a pessoa desenvolver psicose. Outro dado é sobre casos de esquizofrenia. Segundo pesquisas, em comparação com uma pessoa que não faz uso de maconha, a que consome a droga tem quatro vezes mais chance de ter o primeiro surto esquizofrênico. E em casos de depressão, a cannabis sativa aumenta em 30% os sintomas da doença, assim como em 3% a intenção suicida. Para finalizar, o médico afirmou que estudos apontam que pessoas que utilizam a droga e possuem depressão aderem 4% menos ao tratamento da doença.

Texto e fotos: Milena Nandi 

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